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Igor Santiago fala da quebra de sigilo bancário ao Consultor Jurídico

21 de janeiro de 2008
Em matéria acerca da polêmica em torno da nova norma da Receita Federal, editada após o fim da CPMF, que, na prática, quebra o sigilo bancário dos correntistas, site Consultor Jurídico entrevista Igor Mauler Santiago.

 

 

Dados descobertos

OAB vai ao Supremo contra quebra de sigilo bancário

 

A OAB vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal para contestar a quebra de sigilo bancário imposto pelo governo federal com o fim da CPMF. A Ação Direta de Inconstitucionalidade questionará a Lei Complementar 105/2001. Esta norma possibilitou a edição da Instrução Normativa 802 da Receita Federal, que obriga os bancos a repassar informações dos correntistas cuja movimentação semestral chegue a R$ 5 mil no caso de pessoas físicas e R$ 10 mil no caso de pessoas jurídicas.

 

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Cezar Britto, defende que a quebra de sigilo bancário só pode acontecer nos casos em que houver ordem judicial. “Fora disso, qualquer quebra de sigilo, seja bancário, fiscal ou telefônico, é inconstitucional e não pode prevalecer no ordenamento jurídico do país.”

 

A decisão de entrar com a ação foi tomada em reunião da Comissão Especial de Direito Tributário, nesta segunda-feira (21/1). Os integrantes da comissão avaliaram que não cabe Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a instrução normativa, mas sim contra a Lei Complementar 105, na qual é baseada a medida da Receita Federal.

 

“A instrução tem um vício de origem que é a Lei Complementar 105, que é inconstitucional ao quebrar o sigilo. Por isso, vamos propor a adequação da instrução e da lei à Constituição Federal”, declarou o presidente da OAB. Ele lembra que já existem ações no Supremo contestando a norma. E diz que a ADI será um instrumento para reforçar os fundamentos já apresentados contra a lei.

 

Segundo Cezar Britto, a medida da entidade não vai interferir nos mecanismos governamentais de combate à sonegação. “O aparato legal que regulamenta o Coaf e outros instrumentos de fiscalização da Receita não serão questionados e continuam funcionando legalmente”, afirmou.

A Comissão Especial de Direito Tributário da OAB é presidida pelo professor e ex-secretário da Receita Federal Osíris de Azevedo Lopes Filho. Além dele e de Cezar Britto, participaram da reunião o vice-presidente Vladimir Rossi Lourenço, a secretária-geral Cléa Carpi da Rocha e o diretor-tesoureiro Ophir Cavalcante Junior.

 

Medida controversa

A OAB aderiu à corrente dos que se baseiam nos incisos X e XII do artigo 5º da Constituição para dizer que a instrução normativa, na verdade, trata de quebra de sigilo bancário. O dispositivo diz que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. O inciso XII é mais específico: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas (…)”. A quebra só é aceita em casos excepcionais, com autorização do Judiciário.

 

Mas há os que entendem que os sigilos fiscal e bancário não têm garantia constitucional. Para Fábio Wanderley Reis, cientista político e professor da Universidade Federal de Minas Gerais, é evidente o interesse público da fiscalização exercida pela Receita e, portanto, os direitos fundamentais dos cidadãos têm de ser entendidos como relativos.

 

Em artigo publicado no jornal Valor Econômico, o professor disse que não há na Constituição qualquer norma que garanta expressamente o sigilo bancário, apesar da garantia genérica, no artigo 5º, da inviolabilidade da intimidade e do sigilo de dados. Ao invés disso, diz, o artigo 145, em seu parágrafo 1º, diz que a administração tributária deve cumprir os objetivos, nos termos da lei e respeitando os direitos individuais, podendo “identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.

 

Guerra ao crime

Em nome do combate à violência, o governo federal defende que todos os seus órgãos possam trocar informações disponíveis sobre os contribuintes. Foi o que defendeu o advogado-geral da União, José Antônio Dias Toffoli, em parecer preliminar apresentado em encontro do Encla (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro), em dezembro de 2007.

 

Segundo o advogado-geral, “essa troca de dados não configura quebra de sigilo, mas transferência dele”. E elas não aconteceriam de forma imotivada. Toffoli esclarece ainda que a controvérsia existe porque a Constituição Federal não tratou explicitamente do sigilo bancário ou fiscal em seu texto. Ela fala sobre sigilo de dados. E por isso dá margem a vários tipos de interpretação.

 

O parecer elaborado pela AGU está sendo analisado por diversos órgãos públicos que enviarão as suas sugestões e opiniões. A partir deles é que será feito um parecer definitivo. No primeiro trimestre de 2008 ele estará pronto, pelos cálculos do ministro Toffoli.

 

“Um segredo que todo mundo conhece não é mais segredo”, constata o tributarista Igor Mauler ao comentar o parecer da AGU. Para ele, não se pode ferir o sigilo dos dados dos contribuintes como forma de combate à criminalidade. “Essa forma de abertura dos dados não trará ganho nenhum para a sociedade”, critica.

 

Mauler não tem dúvidas de que a Constituição Federal defende o sigilo bancário e fiscal do cidadão. Ressalta que este não é absoluto, mas a quebra deve depender de fortes indícios, justificativas e um bom fundamento apresentado por um membro do Judiciário.

 

Segundo o tributarista, a LC 105/2001 nunca entrou de fato em vigor porque ficava encostada na CPMF. Com a extinção do imposto, ele acha que as duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade que a contestam devem voltar à pauta de julgamento.

 

 

Leia nota emitida pela Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB

 

1. A Comissão Especial de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil, reunida no dia 21 de janeiro de 2008, apreciando a Instrução Normativa n° 802, de 27 de dezembro de 2007, resolveu propor à diretoria do Conselho Federal da OAB, ingressar com Ação Direta de Inconstitucionalidade com ênfase na obtenção de medida cautelar para a suspensão da eficácia do artigo 5° do Decreto Complementar n° 105, de 10 de janeiro de 2001, do Decreto 4489/2002, e por decorrência da instrução normativa da Receita Federal do Brasil, n° 802/2007.

 

2. Citada a instrução normativa com ênfase em tal Decreto e Lei Complementar exige que as instituições financeiras forneçam à Secretaria da Receita Federal do Brasil informações semestrais e identificar os titulares das operações e os usuários dos serviços, em que o montante global movimentado em cada semestre seja superior, tratando-se de pessoa física, a R$ 5.000,00 (cinco mil reais), e pessoa jurídica, a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

 

3. Tal ato normativo administrativo ofende direitos escritos na Constituição Federal entre os direitos e deveres individuais e coletivos, no seu artigo 5°, como o direito à intimidade (inciso X) e ao direito ao sigilo (inciso XII).

 

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